4º ano EJA
5ª ATIVIDADE
Disciplina de Sociologia
Seção 2 – Unidade II
Vamos falar de violência?
Fonte:https://www.bing.com/images/search?q=imagem+viol%c3%aancia+dom%c3%a9stiaa&view=detailv2&&id=080B2503D4FCF95D73F1D44362EF43C0A12C570F&selectedIndex=0&ccid=LmKjdySu&simid=607997379563881727&thid=OIP.M2e62a37724ae1a493d0e8f10f1c3e7d9H0&ajaxhist=0
Exclusão social e violência, muitas vezes, caminham juntas – e
isso fica claro quando percebemos que os grupos que mais são vitimados pela
exclusão são os que sofrem com mais intensidade os efeitos da violência. Mas,
o que seria esse fenômeno social?
Buscar o significado das palavras nos ajuda a entender
determinadas práticas. Violência,
segundo o dicionário Aurélio, é o “ato ou efeito de violentar”, e “violentar”,
no mesmo dicionário, aparece como sinônimo de “violar”. Vamos começar esse papo pensando a
violência como toda forma de ação que viola algo de alguém ou até esse
próprio alguém. É violento o assalto que lhe viola a posse de um objeto, é
violenta a acusação que lhe tira a paz, é violento o preconceito que lhe tira a condição de dignidade, é violento o
assassinato por violar o seu direito de viver. Toda violência, a princípio, surge de um uso abusivo ou injusto de
alguma forma de poder.
Mas é interessante refletir que nem tudo que parece violento aos
nossos olhos pode assim ser classificado. Vamos a dois exemplos: o primeiro deles, uma luta de boxe. Apesar de ser
uma medição de forças e técnicas, os lutadores estão de acordo em ferir-se e serem feridos. Se ninguém descumprir as
regras estabelecidas, de conhecimento de ambos, o uso das forças ali presentes não viola os direitos de ninguém. Sendo
assim, tal luta pode ser definida como violenta?
O outro exemplo retiramos do livro “O mundo funk carioca”, do
antropólogo Hermano Vianna, que, ao estudar
os bailes funks das décadas de 80 e 90, percebeu que as brigas existentes
nessas festas não eram simples brigas que
explodiam no calor das emoções, mas uma espécie de “performance” que acontecia em momentos já previamente estabelecidos pelo ritual do baile.
Alguns rapazes definiam esse momento como “15
minutos de alegria”. Sendo uma
performance e estando
ali os participantes de forma espontânea, podemos dizer que há violência, mesmo
que esteja presente o uso da força?
Já, ao
contrário, podemos violentar pessoas sem
encostar um único dedo nelas, e em alguns casos, sem que a vítima a perceba
como uma violação. Por exemplo, você frequenta as aulas na escola e vê que tudo
que é apresentado como natural e correto, muitas vezes, corresponde a práticas
dos grupos das classes médias e alta – a música que eles escutam chamamos de
“clássica” ou “erudita” – enquanto as práticas culturais das populações mais
pobres (quando são abordadas em aulas ou em materiais didáticos) são
“folclorizadas” ou até criticadas – veja o caso do funk, que até hoje alguns
insistem que não pode ser chamado de cultura.
O
sociólogo francês Pierre Bourdieu
nomeou esse processo de violência
simbólica.
Figura
5: O sociólogo francês Pierre Bourdieu (1930-2002).
“Para Bourdieu, o sistema escolar, em vez de oferecer acesso democrático de uma competência cultural específica para todos, tende a reforçar as distinções de capital cultural de seu público. Agindo dessa forma, o sistema escolar limitaria o acesso e o pleno aproveitamento dos indivíduos pertencentes às famílias menos escolarizadas, pois cobraria deles os que eles não têm, ou seja, um conhecimento cultural anterior, aquele necessário para se realizar a contento o processo de transmissão de uma cultura culta. Essa cobrança escolar foi denominada por ele como uma violência simbólica, pois imporia o reconhecimento e a legitimidade de uma única forma de cultura, desconsiderando e inferiorizando a cultura dos segmentos populares.Assim, convertendo as desigualdades sociais, ou seja, as diferenças de aprendizado anterior, em desigualdadesde acesso à cultura culta, o sistema de ensino tende a perpetuar a estrutura da distribuição do capital cultural, contribuindo para reproduzir e legitimar as diferenças de gosto entre os grupos sociais. Posto isso, as disposições exigidas pela escola, como, por exemplo, as sensibilidades pelas letras ou pela estética visual ou musical, enfim, uma estética artística, privilégio de alguns poucos, tendem a intensificar as vantagens daqueles mais bem aquinhoados material e culturalmente" (SETTON, 2008).Já que estamos fazendo o exercício de pensar para além do senso comum, podemos dizer ainda que a violência não é igual para todos os grupos humanos. Ela é uma construção social, ou seja, o que é violento – a até mesmo a gravidade de uma violência – pode variar de sociedade para sociedade. Se você mora em uma capital ou região metropolitana, ao visitar uma cidade do interior, certamente ouvirá narrativas que apontam como a violência cresceu naquela localidade, mas se for comparar com o seu contexto (sem relativizar as diferentes experiências), certamente entenderá aquelas queixas como exageradas.Durkheim (2002) aponta, por exemplo, que o assassinato, seja quem for a vítima, se tornou o ato imoral por excelência, a mais estúpida forma de violência e o mais cruel dos crimes. Mas, na Roma Antiga, era diferente: Agamben (2010) aponta a existência de homos sacers, pessoas com uma posição inferior naquela sociedade, cujo assassinato não causava responsabilidades legais para o assassino. Os homos sacers eram considerados vidas que poderiam ser tiradas por qualquer um, pois eram um tipo de humano excluído de todos os direitos civis, podendo ser morto por qualquer cidadão sem que tal ato constituísse um crime. Era uma vida “dispensável”; estava fora do direito e, por isso, não poderia ser condenada no âmbito jurídico. Estava exposta à vulnerabilidade da violência por ser desprovida de qualquer direito.Certamente, se o assassinato não fosse crime em nosso grupo social, haveria outra forma de violência inaceitável entre nós. A partir desses casos, podemos pensar que em localidades onde não há traficantes armados e trocas de tiros, a população encaminha seus esforços morais para outras formas de violência que impactam o seu cotidiano. Talvez seja por isso que você ache exageradas as percepções sobre a violência local que os moradores das cidades do interior demonstram.Para refletir...Sobre a mudança da importância de um determinado tipo de crime ou violência, vale a pena ler o que escreveu Durkheim em "As Regras do Método Sociológico":O roubo e a simples indelicadeza não ofendem senão um único e mesmo sentimento altruísta: o respeito à propriedade de outrem. Só que esse mesmo sentimento é ofendido de modo mais fraco por um desses atos do que pelo outro; e como, além disso, ele não tem na média das consciências uma intensidade suficiente para sentir vivamente a mais leve dessas duas ofensas, esta será objeto de uma maior tolerância. Eis por que se censura simplesmente o indelicado, ao passo que o ladrão é punido. Mas se o mesmo sentimento tornar-se mais forte, a ponto de fazer calar em todas as consciências aquilo que inclina o homem ao roubo, ele se tornará mais sensível às lesões que, até então, apenas o tocavam levemente; ele reagirá portanto com mais firmeza contra elas; tais lesões serão objeto de uma reprovação mais enérgica que fará passar algumas delas, de simples faltas morais que eram, ao estado de crimes (2007, p. 68-69).Já parou para pensar por que a nossa sociedade tolera uma grosseria ou indelicadeza com o outro, mas acha necessário punir com rigor o roubo, ou seja, a ofensa ao direto de propriedade do outro?Quem pode ser violento?Normalmente, identificamos a violência como um erro por parte do agressor e alguns atos violentos, como ferir, tirar a liberdade de um indivíduo e matar, são geralmente punidos com grande rigor em nossa sociedade. Há, porém, um tipo de agente social que pode cometer tais violências sem ser punido ou responsabilizado por tais atos.Segundo Max Weber, não se pode definir o Estado (pelo menos, na Sociologia) a partir das suas finalidades, mas sim a partir dos meios que lhe são peculiares. E o que isso quer dizer? Nesse caso, falamos do uso da força física, sobre a qual todos os Estados se fundamentam e se mantêm. Sendo assim, tal pensador não pestaneja em identificar as relações firmadas entre o Estado e a violência como estritamente íntimas.Hoje, porém, temos de dizer que o Estado é uma comunidade humana que pretende, com êxito, o monopólio do uso legítimo da força física dentro de um determinado território. Note-se que o ‘território’ é uma das características do Estado. Especificamente, no momento presente, o direito de usar a força física é atribuído a outras instituições ou pessoas apenas na medida em que o Estado o permite. O Estado é considerado como a única fonte do ‘direito’ de usar a violência (WEBER, 1974, p. 98).Para fazer uso da violência, com a alegação de garantir o cumprimento das leis e a manutenção da ordem, o Estado confere autoridade às polícias e demais grupos militares que servem como seu braço armado. Porém, tal uso legítimo da força não pode ser feito de qualquer forma: deve se pautar no sistema legal em que tal prática se diz defender e manter. Por exemplo, um policial não pode matar sem motivos, só tem autorização para fazer isso quando o criminoso coloca em risco iminente a vida do próprio oficial ou de outros cidadãos: chamamos essa prática, no Rio de Janeiro, de “auto de resistência” e, em São Paulo, de “resistência seguida de morte”. Caso contrário, o criminoso deverá ser preso, tendo todos os seus direitos garantidos, e se isso não for feito, o policial responderá por abuso de poder e assassinato.Segundo dados apresentados em um relatório do NECVU (Núcleo de Estudos da Violência Urbana – UFRJ), entre os anos de 2001 e 2011, mais de dez mil pessoas tiveram suas mortes em confronto registradas como auto de resistência no Estado do Rio de Janeiro (MISSE, 2011). Para algumas análises dessa informação, houve uma banalização dos “autos de resistência”, com o objetivo de ocultar execuções sumárias e outras práticas para além do exercício legítimo da violência.
Saiba Mais...
Você sabia que existe o Anuário Brasileiro de Segurança Pública? Nele é possível acessarmos dados sobre estatísticas criminais, gastos com segurança pública e prisões, população carcerária e contingente de policiais. Em 2014, o Anuário revelou alguns dados significativos. Para ver mais informações, acesse: http://www.forumseguranca.org.br/storage/download//anuario_2014_20150309.pdf
* Este material é uma adaptação dos Módulos produzidos pela Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro intitulado “Ciências Humanas e suas tecnologias” de autoria da CECIERJ












